Ano Novo e a vontade de sempre. 2021 arrancou há 4 dias e nós vamos já partilhar convosco a primeira conversa do ano. Na realidade esta conversa ainda foi feita em 2020, mas com o trabalho a apertar no final do ano e as festas a chegarem optámos por partilhar agora, onde todos já estamos mais concentrados nesta nova etapa. Depois dos ilustres sommeliers que já por aqui passaram, chega agora a vez de partilharmos uns dedos de conversa com aquele que é sem dúvida uma referência no mundo vínico em Portugal. Falamos de André Figuinha, o incrível sommelier do Restaurante Feitoria no Altis Belém Hotel & Spa.
Mais tarde, em 2007, fruto da passagem pelo restaurante 39 Degraus, na altura liderado pelo chef Luís Baena frequentou dois cursos especializados, o de Técnica e Serviço de Vinhos e o de Escanção, na Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril e em 2019 ganha o prémio de Sommelier do Ano pela Mesa Marcada e ainda neste mesmo ano também pela Grandes Escolhas. Entrou para o Feitoria em 2010, depois de ter sido responsável pelo serviço da cafetaria Mensagem, também no Altis Belém Hotel & Spa. Atualmente a par do Feitoria, abraça também os projetos com o Chef João Rodrigues na elaboração das cartas de vinhos do Rossio GastroBar, Mercado da Ribeira Time Out e a Cafetaria Mensagem.
1 – Começamos pelo óbvio. Para ti o que é um sommelier / escansão e qual a sua principal função nos dias de hoje?
- Identifico com alguém, que além de um enorme gosto pelo que faz, tem um grande conhecimento sobre vinhos e bebidas e um sentido de lugar muito pessoal e próprio.
Como definição de trabalho deverão aconselhar, monitorizar necessidades dos clientes em sala, criar as melhores ligações entre pratos e comidas, serem responsáveis pelas apresentações das cartas, reposição de stocks e escolhas de novas referências.
No que diz respeito à imagem, terem orgulho no que foi construído, tentar manter e elevar o estatuto da classe, e de alguma forma tentar fazer algo que tenha a ver com a dinamização da profissão, na apresentação, passagem e partilha de conhecimento.
O caminho traçado poderá talvez levar à próxima grande revolução da restauração e hotelaria.
2 – O que te fez apaixonar por este vasto mundo dos vinhos?
- Tanta coisa!
Depois de tanto tempo nesta profissão, acho que continuo a descobrir coisas que gosto: deixei um curso de informática de gestão para me dedicar à restauração e na realidade, acho que foi uma vontade que foi crescendo e foi tornando-se cada vez mais consistente com o passar dos anos. O vinho envolve-nos e traz-nos diferentes interpretações, conversas, desafios e no fundo novas descobertas.
3 – Eça de Queiroz uma vez disse: “diz-me o que comes, dir-te-ei quem és. Achas fútil ou pretensioso definir uma pessoa não pelo que ela come, mas sim pelo vinho que ela bebe?
- Acho que não podemos definir as pessoas dessa forma até porque das mais variadas vezes que o tentamos fazer conscientemente a tendência é para correr mal… traduzindo e explicando é um “pré” ”conceito”. Fazer juízos baseado em observação deixou de ser para mim já há muito tempo um valor acrescentado, para passar a ser na verdade uma menos valia e um defeito profissional com o qual não me quero identificar. O mundo globalizou-se e o acesso que temos quer de informação quer de diferentes produtos é muito vasto. A verdade é que podemos estar em qualquer lado do mundo a beber determinados vinhos que não são da nossa região e dos quais temos acesso num click. Não tem necessariamente de fazer parte do meio ou do sítio que vivemos ou que frequentamos. Fazia sentido enquanto Eça dizia, e seguindo a frase proposta, que “O carácter de uma raça pode ser deduzido simplesmente do seu método de assar a carne.” e comparando aqui com a forma de agir, o facto de podermos e devermos definir perfis, estilos, locais, que sejam sinónimos orgulhosamente de sentido de terra, de gentes e dos seus costumes. Falamos de Terroir.
4 – Vamos fazer um jogo. Em vez de propores o wine pairing perfeito para uma refeição, pensa nos vinhos que mais gostas e que primeiro te vêm à memória para harmonizar os seguintes pratos: pescada cozida, costeletas de borrego fritas e brisas do Liz.
- Champagne Jacquesson Avize, Imperfeito-Dão e Madeira Blandy´s Bual 1957…
5 – Com tantas castas existentes não só em Portugal, mas também pelo mundo fora, para ti qual a que melhor se define como monocasta e qual o blend mais consensual ao palato dos portugueses?
- Vou sempre defender o que é nosso… e enquanto casta acho que o Arinto é casta rainha em Portugal e o blend terá de ir para Touriga Nacional, Tinta Roriz e Touriga Franca…
6 – Cada vez mais aparecem pessoas interessadas no vinho, mas com um conhecimento muito reduzido. Que cursos ou livros recomendas fazer e ler para se adquirir não só conhecimento, mas acima de tudo cimentar o gosto por este néctar dos deuses?
- Bom… acho que mais do que qualquer leitura, que é muito importante claro, muito deste conhecimento vem da nossa interpretação da prova.
Aconselho talvez a irem a garrafeiras ou distribuidores que tenham um serviço de aconselhamento especializado de forma a adquirirem uma opinião sobre determinada casta, região ou produtor e também partilhar essa informação e trocar esse conhecimento. É importante ir a diferentes garrafeiras para não cairmos em tendências até que tenhamos a nossa opinião formada.
As visitas aos locais, quintas, na minha opinião continuam a ser o que melhor funciona para mim em termos de compreensão de região perfil ou castas… e sim, não dá para ir a todo o lado!.... Venham os livros!
Quanto a leituras, coisas que não sejam muito maçudas para enófilos, livros como da Madeline Puckette Winefolly por exemplo, ou ir um pouco mais além e ter um atlas da Jancis Robinson ou Vinhos do André Dominé.
Não esquecer, e vi recentemente, que filmes como o Somm 1, 2 ou 3 retratam bem este fantástico mundo de sommeliers e podem ajudar na decisão a tomar relativa a um curso!
Neste tema dos cursos, existem vários níveis de WSET em Portugal, que permitem de uma forma certificada e reconhecida formalizar o conhecimento adquirido nos vinhos. De uma forma profissional será na EHTL que se deverá dirigir para efetuar um curso certificado para trabalhar na área…será um pouco mais longo.
E por fim, não tenham medo de se deixar ficar nas mãos de um profissional num restaurante dando-lhe liberdade de escolha indicando, sem qualquer tipo de vergonha, os limites, perfis, o valor e conseguindo assim cimentar o vosso conhecimento com novas abordagens e experiências.
7 – Vamos às perguntas de resposta rápida:
- Qual o teu vinho nacional favorito e com o que é que o acompanhas?
- Casa do Capitão-Mor Alvarinho Sobre Lias com ameijoas à Bulhão Pato!
- Qual o teu vinho internacional favorito e com o que é que o acompanhas?
- Silex Didier Dagueneau com arroz de lingueirão
- Qual a tua região vínica nacional favorita e porquê?
- Gosto do Dão pela versatilidade pouco explorada, longevidade e expressão dos brancos.
- Que vinho bebeste e que infelizmente já não voltarás a beber?
- Chateau Margaux Primier Grand Cru Classé talvez… Mas a lista não para, houve muita coisa que provei que dificilmente volto a beber!
8 – Para terminar pedimos-te que nos indiques quais são os vinhos que temos de ter sempre em casa nos seguintes escalões de preço:
Até 5€: Espumante Caves São João Bruto, Casa de Paços Loureiro e Arinto, Camolas Premium tinto.
Até 10€: Contraste branco, Apelido Tinto, Herdade do Cebolal Branco.
Até 25€: Druida Reserva Branco, Quinta de Pancas Vital, Quinta das Bágeiras Garrafeira Tinto, Cabriolet, Soalheiro Alvarinho Reserva, Espumante Murganheira Czar Cuvée Bruto.
Até 50€: Álvaro de Castro Quinta da Pellada, Quinta Monte d´Oiro Vindima 13 de Outubro branco, Buçaco branco, Quinta dos Roques Alfrocheiro Preto, Espumante Vádio.