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Conversas sobre o Vinho - Marc Pinto.

Mais uma referência do panorama vínico em Portugal, Marc Pinto é um jovem sommelier nascido na década de 90 em França, mais propriamente em Reims, capital do Champagne. Criado em S.M da Feira, aos 20 anos mudou-se para o Porto e com apenas 23 fez as malas e rumou a Barcelona, sempre com o objetivo de crescer e aprender tanto a nível pessoal como profissional, começando assim o desenvolvimento de uma (ainda) curta carreira mas já bastante premiada.


Formado em Gestão Hoteleira mas sempre com grande aptidão para o mundo dos vinhos, foi em 2012 que ao participar nos bastidores do concurso Mundial de Bruxelas Guimarães, um evento que põe à prova 8000 vinhos que teve a certeza que queria seguir o rumo de Escanção/Sommelier. 

Com um curriculum já invejável, os primeiros passos oficiais como sommelier aconteceram em 2014 na Enoteca em Barcelona com 2 estrelas Michelin. Em Novembro de 2016 conquistou a 3ª estrela Michelin no Lasarte também em Barcelona ao lado da sua equipa, nessa altura já era Sommelier principal. Atualmente Marc está no FiftySeconds na cúpula da Torre Vasco da Gama, onde continua a trabalhar com Martín Berasategui, detentor de 12 estrelas Michelin o que faz dele um dos chefes com mais estrelas do mundo e com Filipe Carvalho como Chef executivo.



1 – Começamos pelo óbvio. Para ti o que é um sommelier / escansão e qual a sua principal função nos dias de hoje?

- O Sommelier ou escanção é a pessoa responsável pela gestão de uma garrafeira, no meu caso de um restaurante com uma estrela Michelin. É também o profissional que executa o serviço de vinhos e outras bebidas durante a experiência gastronómica do comensal. Aconselhamos o cliente na escolha da sua garrafa de vinho, fazemos a prova para garantir a máxima qualidade e a ausência de defeitos, seguido pela seleção do copo a usar para o estilo do vinho em questão. Por vezes um copo diferente para cada ocasião é o suficiente para ser o par perfeito para aquele momento.
Deixando as definições técnicas aparte, um escanção para mim é um profissional que tem como objetivo dar vida ao vinho que esta adormecido dentro da garrafa. Salvando as distâncias é como o príncipe da Disney, quando este acorda a Bela Adormecida apenas com o seu toque. É um profissional que procura enaltecer todas as características boas de cada vinho e com a sua arte amoniza-lo na perfeição com cada pessoa.
Como contador de histórias que é, deve possuir muita cultura geral para aproximar e transmitir de uma forma fácil e genuína o seu conhecimento de vinho as pessoas que tem a sua frente. Deve ser capaz de fazer viajar os comensais pelas diferentes regiões vinícolas nacionais e internacionais sem que para isso tenham que sair da mesa, pelo menos fisicamente.
Termino com um par de adjetivos que considero essências num bom escanção: discreto, bom ouvinte e detalhista.

2 – O que te fez apaixonar por este vasto mundo dos vinhos?

- A minha relação com o mundo do vinho nasce em 2008, na altura aluno na EHT Santa Maria da Feira. O então formador e escanção Vítor Pinho, conhecido com carinho por ‘’Mestre’’, foi a primeira pessoa que me passou esta paixão que ele tinha dentro dele.
No decorrer da minha carreira surgiram vários ‘’Mestres’’ e todos eles ajudaram a que esta paixão aumentasse. No fundo e feitas as contas quem me fez apaixonar por este mundo foram as pessoas que se cruzaram no meu caminho. Podia dizer-se que isto é ‘’contagioso’’. (risos).

3 – Eça de Queiroz uma vez disse: “diz-me o que comes, dir-te-ei quem és. Achas fútil ou pretensioso definir uma pessoa não pelo que ela come, mas sim pelo vinho que ela bebe?

- Acho que não. Eu costumo usar uma frase que é ‘’o gosto classifica e classifica o provador’’.
Isto para mim é importante pois não devemos ir contra o nosso gosto pessoal. Eu como sommelier posso achar determinado vinho um máximo e quero recomendar a toda a gente. Mas haverão pessoas que acharão esse mesmo vinho só normal ou simplesmente acharão que o vinho é mau. O gosto de cada um é imutável instantaneamente.
O trabalho que faço no dia a dia consiste em fazer um ‘’diagnóstico’’ do gosto pessoal, comida que vão disfrutar, ocasião a celebrar e onde estamos em espaço e tempo. Após estes pontos estarem calibrados a resposta final é o vinho que recomendo. E sim após este trabalho deixo registado que perfil de pessoa tenho a frente, para que numa próxima ocasião o meu trabalho seja mais eficiente.
Diz-me o que bebes (no teu dia a dia), dir-te-ei o que beber hoje (juntando todas as variáveis).


4 – Vamos fazer um jogo. Em vez de propores o wine pairing perfeito para uma refeição, pensa nos vinhos que mais gostas e que primeiro te vêm à memória para harmonizar os seguintes pratos: gambas da costa, rojões e panacotta.

 - Gambas da costa um Pequenos Rebentos Vinhas Velhas Loureiro, Vinhos Verdes; para os Rojões um Vadio Tinto, Bairrada; para a Panacotta um Fungus Podridão Nobre, Bairrada.

5 – Com tantas castas existentes não só em Portugal, mas também pelo mundo fora, para ti qual a que melhor se define como monocasta e qual o blend mais consensual ao palato dos portugueses?

- A casta que no ano de 2020 mais me surpreendeu foi a Loureiro. Provei alguns dos melhores brancos portugueses com esta variedade de uva. Penso que o melhor está por ver e tenho uma expectativa alta em relação a vinhos desta casta. 
O blend mais consensual recai sobre a Tinta Roriz e a Touriga Nacional. É um lote que encontramos de Norte a Sul do país e por isso está tão presente nas nossas vidas.
Deixo um conselho, com um país tão diverso em variedades de vinho, recomendo provar um vinho novo pelo menos uma vez por semana, no final do ano estarás 52 vinhos mais rico de conhecimento que no ano anterior.

6 – Cada vez mais aparecem pessoas interessadas no vinho, mas com um conhecimento muito reduzido. Que cursos ou livros recomendas fazer e ler para se adquirir não só conhecimento, mas acima de tudo cimentar o gosto por este néctar dos deuses?

- Ponto número um recomendo beber vinho todos os dias, claro está, com moderação. A vida torna-se mais alegre e as refeições melhores a nível de combinações líquido e sólido.
Por outro lado recomendo a seguirem o trabalho que os sommeliers nacionais estão a fazer nas redes sociais. É conhecimento gratuito e de fácil digestão.
Se procurarem algo com certificação recomendo os cursos do WSET para começar. Simples, direto e sem espinhas.


7 – Vamos às perguntas de resposta rápida:

- Qual o teu vinho nacional favorito e com o que é que o acompanhas?

- Grande Druida Encruzado, Arroz caldoso de tomate e Lavagante.

- Qual o teu vinho internacional favorito e com o que é que o acompanhas?

- Champagne, com família e amigos.

- Qual a tua região vínica nacional favorita e porque?

- Douro, desde miúdo que tenho gravadas na memória as encostas do Douro e as cores de Outono das mesmas. Único, é a mais bonita região do mundo.

- Que vinho bebeste e que infelizmente já não voltarás a beber?

- Um vinho madeira de 1766, provavelmente posso voltar a beber. Mas a primeira vez…


8 – Para terminar pedimos-te que nos indiques quais são os vinhos que temos de ter sempre em casa nos seguintes escalões de preço:

Até 5€: Quinta do Cardo branco e tinto

Até 10€: M.O.B Lote 3

Até 25€: A Cerca dos Frades

Até 50€: Casa da Passarella Villa Oliveira Touriga Nacional.