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Conversas sobre o Vinho - Ivo Peralta

Falar de sommeliers e não falar de Ivo Peralta não nos faz qualquer sentido. O jovem sommelier é irreverente nos atos e resiliente no conhecimento desta arte. Ivo Peralta nasceu e foi criado junto à famosa praia de nudismo, a Praia do Meco, desde 1991. Todos os seus 30 anos de vida foram vividos na área da restauração, inicialmente no restaurante de peixe e marisco dos pais, e posteriormente no Fine-Dining onde se encontra desde 2014. Vindo da Escola de Hotelaria e Turismo do Estoril onde frequentava o curso de Gestão Hoteleira – Restauração e Bebidas Nível 5, foi levado pela ambição ao Hotel Fortaleza do Guincho (1*Michelin), onde estagia e trabalha com Inácio Loureiro. Em 2015 termina a sua formação académica e integra a equipa do Restaurante Eleven (1*Michelin). Nesta mesma altura, inicia a certificação de Escanção na Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa, que termina em Julho de 2016. 

Numa fase seguinte, é convidado para integrar a equipa de Escanções do Restaurante Fortaleza do Guincho, começando como assistente de Inácio Loureiro e assumindo a posição de escanção principal após a sua saída. Em Outubro 2016 ganha o seu primeiro concurso , o Ruinart Challenge Portugal. Ambicionando por mais, enche-se de entusiasmo e avança para o Concurso Nacional de Escanções onde se qualifica em 2º lugar em Janeiro de 2017. Em  Março do mesmo ano adquire o Certified Sommelier pela Court of Masters Sommeliers. Um ano depois, consegue alcançar o tão desejado 1º Lugar no Concurso Nacional de Escanções 2018, garantido o lugar no ASI Best World Sommelier 2019, onde termina em 48º lugar.

Durante este período ingressa num novo projeto, Epur – Vincent Farges, que conquista a 1ª Estrela Michelin após um ano de abertura. O seu trabalho é distinguido pela Revista Grandes Escolhas que o nomeia Sommelier do Ano 2018, e pela Academia Internacional de Gastronomia com o Prix au Sommelier 2019. Atualmente trabalha como Head Sommelier no espaço JNcQUOI Club e nunca nos deixa de copo vazio.

1 – Começamos pelo óbvio. Para ti o que é um sommelier / escansão e qual a sua principal função nos dias de hoje?

- O sommelier é um profissional focado no serviço de vinhos do restaurante, isto é a base, mas para mim um sommelier tem de ser algo mais, tem de ter conhecimento de todas as bebidas em geral e cada vez mais ser um gestor, nós conseguimos aumentar o revenue de um restaurante, isso consegue mostrar-se em valores, e também oferecer uma qualidade e proposta de serviço diferenciadora.

2 – O que te fez apaixonar por este vasto mundo dos vinhos?

- Sempre tive uma ligação com a restauração e lembro-me do primeiro vinho que provei e detetei alguns aromas. Aquilo que me fez apaixonar por este mundo foi por ver a diversidade que existe e especialmente pelo papel do sommelier num restaurante. A minha grande inspiração veio de uma entrevista em 2011/2012 do João Pires, na altura o único Master Sommelier português, que me abriu os horizontes sobre a profissão e o trabalho de um sommelier.

3 – Eça de Queiroz uma vez disse: “diz-me o que comes, dir-te-ei quem és. Achas fútil ou pretensioso definir uma pessoa não pelo que ela come, mas sim pelo vinho que ela bebe?

- Não acho que seja fútil ou pretensioso, porque da mesma forma que uma pessoa escolhe o restaurante pelo que gosta de comer o mesmo faz com os vinhos, não podemos julgar uma pessoa que gosta sempre de beber um determinado vinho, seja ele com um grande rótulo ou um vinho de pequeno produtor. 
Conseguimos tirar ideias sobre o tipo de personalidade dessa pessoa, mas não devemos julgar, porque trabalhamos com gostos e todos temos gostos diferentes.


4 – Vamos fazer um jogo. Em vez de propores o wine pairing perfeito para uma refeição, pensa nos vinhos que mais gostas e que primeiro te vêm à memória para harmonizar os seguintes pratos: Alheira com grelos, Cozido à Portuguesa e Aletria.

- Alheira com grelos, não é nada amigo do vinho, portanto iria para um espumante, um Luís Pato Vinha Pan. Para o Cozido à Portuguesa, iria para um Bairrada ou Dão tinto, escolhia um Quinta dos Roques Garrafeira de preferência o 2008, temos estrutura, combinada com uma parte mais rústica, terrosa, mas todo ele num conjunto muito envolvente. Aletria, volta a não ser um prato fácil, mas escolheria um colheita tardia, Fungus 2015 feito pelo José Carvalheira, aqui ligaríamos o doce com doce, não seria a harmonização perfeita, mas os mais gulosos iriam gostar.

5 – Com tantas castas existentes não só em Portugal mas também pelo mundo fora, para ti qual a que melhor se define como monocasta e qual o blend mais consensual ao palato dos portugueses?

- A casta que melhor se define como monocasta vou apontar para a Baga, é uma casta que viaja pouco e mesmo quando se encontra noutras regiões que não a Bairrada se consegue sentir a personalidade da casta. Em relação ao blend, tenho de ir pelo best seller dos vinhos em Portugal, o Douro, portanto um blend com Touriga Nacional (em maior percentagem) com Touriga Franca e Tinta Roriz a completar o lote.

6 – Cada vez mais aparecem pessoas interessadas no vinho mas com um conhecimento muito reduzido. Que cursos ou livros recomendas fazer e ler para se adquirir não só conhecimento, mas acima de tudo cimentar o gosto por este néctar dos deuses?

- Em relação aos cursos, eu recomendo os WSET para quem quer começar a descobrir esta área, avançar até ao nível 3 e depois para quem se quer dedicar à Sommelierie tentar pelo menos o nível Intro e Certified da Court of Masters Sommeliers, a exigência é mais alta, a forma de estudo é diferente, mas acho que o futuro da profissão em Portugal tem de ser por mais certificados da Court of Masters Sommeliers porque é o standard a nível internacional.
Os livros, acho que começar com o livro da Wine Folly, que é super didático, fácil leitura e conseguimos aprender muito provando um vinho e olhando para as especificidades das castas, ou seja, mesmo em casa num momento de partilha se consegue descobrir algo novo sem ajuda profissional. A partir dai temos de avançar para livros mais técnicos, World Atlas of Wine pela Jancis Robinson e Hugh Johnson é um must. The Oxford Companion to Wine da Jancis Robinson é um clássico.
E para outros tipos de leitura: Flawless do Dr. Jaime Goode que aborda os defeitos do vinho. The Dirty Guide to Wine, escrito pela Alice Feiring e Pascaline Lepeltier, para os fans de vinhos naturais. Amber Revolution, do Simon J Woolf, que aborda toda a história do “Orange Wines” e que me deu um grande prazer a ler.


7 – Vamos às perguntas de resposta rápida:

- Qual o teu vinho nacional favorito e com o que é que o acompanhas?

- Quinta da Manoella Vinhas Velhas 2017 – com uma boa companhia.

- Qual o teu vinho internacional favorito e com o que é que o acompanhas?

- Château Ausonne 2005 c/ Bife Welligton e molho périgueux

- Qual a tua região vínica nacional favorita e porque?

- Neste momento vou dizer o Dão, está com uma serie de projetos incríveis e são vinhos frescos, elegantes, com carater e longevidade. A região em si é lindíssima, com uma paisagem e clima que merece mais a nossa atenção.

- Que vinho bebeste e que infelizmente já não voltarás a beber?

- Ruinart Blanc des Blancs L’Exclusive 2000 em Magnum.


8 – Para terminar pedimos-te que nos indiques quais são os vinhos que temos de ter sempre em casa nos seguintes escalões de preço:

Até 5€: Porta de Cavaleiros Colheita, Branco Dão

Até 10€:Sidonio de Sousa Special Cuvée, Espumante Bairrada

Até 25€:Pintas Character, Tinto Douro

Até 50€:Quinta da Pellada, Tinto Dão