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Fine Dining - Largo do Paço de Tiago Bonito

No mundo da gastronomia atual cada vez o menos é mais. Menos produção, melhor qualidade na matéria. Menos ingredientes, melhor o sabor de cada um. Mas isto é muito mais simples de se fazer acontecer quando estamos numa cidade que tem tudo ao nosso alcance e nas quais os pequenos produtores já são reconhecidos e entram com facilidade. Se estivermos a falar de uma cidade pequena a coisa não é assim tão simples. Obter boa matéria requer perder tempo à procura dela e mesmo depois de a encontrarmos, requer que o produtor da mesma a continue a produzir do mesmo modo e se possível em quantidade suficiente para satisfazer a nossa cozinha.


Contudo, nesse tempo dispensado na procura, não nos podemos nunca de esquecer do que realmente importa, a nossa cozinha e o nosso cliente. Falar de Tiago Bonito e falar do Largo do Paço é falar da reflexão desta premissa. Tiago é um jovem Chef com um talento único. Há cerca de dois anos deixou Lisboa e rumou a Amarante, tomando rédeas do Restaurante Largo do Paço. Agarrar um restaurante premiado com uma estrela é como começarmos um ano letivo de escolaridade já com 20. Ter o prémio não é assim tão difícil, manter o prémio é que dá trabalho. Trabalho esse que o ano passado voltou a ser reconhecido pelo guia e esperemos que este ano se mantenha tal reconhecimento, pois a refeição que lá fizemos recentemente foi das melhores que tivemos este ano.


Uma equipa jovem, bem formada e competente. Certo que num restaurante desta categoria é o que se espera, mas a humildade e genuinidade daquela equipa é algo único. Da cozinha à sala todos sabem o seu lugar e deveres. David Teixeira, o escanção, já nos havia impressionado no ano passado mas este ano superou todas as expetativas. Ama o vinho como quem ama a vida e isso nota-se a cada copo que nos é sugerido. Certo que a excelente garrafeira do espaço ajuda, e muito, mas mesmo assim toda a seleção é feita por David e nada nem ninguém é melhor que ele para nos sugerir aquele vinho para aquele momento. Seja uma garrafa a partilhar ou um pairing sugerido, o melhor é mesmo deixarmos-nos levar nas suas mão para uma viagem vínica como não há igual.


Mas falemos um pouco do espaço e do Chef. Um restaurante no qual podemos dormir...Na realidade o Largo do Paço fica inserido no luxuoso hotel de charme, Casa da Calçada, com quem partilha todos os exigentes requisitos da cadeia internacional, Relais & Chateaux. Tanto charme e requinte juntos exigem uma cozinha de perfeição. Tiago Bonito, o irreverente e perfeccionista Chef executivo desenha as suas cartas de autor de forma arrojada e criativa, nas quais reflete, na integra, a sua própria identidade enquanto Chef. Tiago é um apaixonado pelas artes da cozinha e considerado um declarado talento da alta cozinha portuguesa, tendo conquistado o título de Chefe Cozinheiro do Ano em 2011, no mesmo concurso em que se distinguiu com o Troféu de Inovação. Todos os seus pratos têm uma história por detrás deles, têm raízes, memórias e experiências. A carta que apresenta agora é uma ode à estação estival, “ao sol da costa portuguesa, aos campos em flor e aos pastos verdejantes repletos de vida”, acrescenta o Chef. “Valorizo os produtos da época, nacionais e locais, de forma a garantir que à mesa dos clientes chegam pratos primorosamente apresentados, preparados e confeccionados com ingredientes da melhor qualidade, estando sempre salvaguardada a variedade e complementaridade que a paleta de sabores dos produtos sazonais oferece”, assegura o Chef.


Na carta preparada surgem dois menus centrais de degustação: “Caminhos” e “Identidade”. No menu “Caminhos” o chef propõe uma viagem pelos paladares dos locais que marcaram a sua vida e as suas vivências, de norte a sul de Portugal. No menu “Identidade” são apresentados 10 novos pratos que refletem os 10 mandamentos do próprio chef, mandamentos que norteiam toda a sua atividade profissional. Na nossa visita mais uma vez deixámos-nos nas mãos do Chef e foi-nos servido um misto de ambos os menus, de modo a podermos conhecer ambas as ofertas. Passemos então à mesa, que o apetite já se faz sentir.



Mal nos sentámos e David, com o seu sorriso e simpatia, serve-nos um flute de espumante da casa. Portal da Calçada, um Cuvée Prestige Brut que serve de pairing para estes momentos iniciais da refeição. Momentos esses que começam com um kombucha de melancia, bem fresca, que ajuda a libertar o palato e serve também como welcome drink. Começa então o desfile de snacks. Corvina, caviar imperial e cebolinho, tudo bem picado e colocado numa lata que é servida à mesa e misturada por nós. Falsas azeitonas verde e preta, na verde um recheio de Dry Martini e na preta um recheio de azeitona verde. Taco de tártaro de vitela e raiz de wasabi e por último um gelado de foie gras e caramelo salgado que servia muito bem de sobremesa, tamanha foi a gulodice que nos deixou na boca.


Saem os snacks e entra um dos elementos que não falta numa mesa portuguesa: o momento do pão. Pão amassado e cozido diariamente no restaurante. Bom miolo, boa crosta e sabores únicos. Azeitona, cogumelos, cerveja, uva e passa e pão da avó eram os disponíveis no dia. A acompanhar manteigas, também elas caseiras, de tomate e pimentos, fumada e tradicional dos açores; bem como um fantástico Azeite Principal onde por diversas vezes mergulhámos o nosso pão.



Começam as entradas e somos brindados por um fantástico Atum rabilho com wasabi, gel de gengibre, creme de abacate, gelado de lima kaffir e angustura bitter. Um prato fresco cheio de sabor onde a doçura do atum e do abacate contrasta com a acidez da lima e a amargura do bitter, um prato perfeito para arrancar e ajudar o palato a preparar-se para o que se seguia. Carabineiro de Sagres, bivalves, coral e citrinos. Um falso tomate de ostra, um ravioli de pepino, um crumble de açafrão, uma água de tomate verde e um gel de cabeça de carabineiro. Um prato que representa a sua passagem e viagem pelo Algarve durante vários anos e a sua grande ligação ao mar e um dos momentos da noite.



David volta à mesa, não para encher os flutes mas para trazer uma nova proposta. Da Quinta das Bágeiras chega um Pai Abel Branco, um vinho de vinhas velhas com mistura de castas que nos abriu o palato para o Presunto Bolota com ervilhas, ovas de salmão, amêijoas e manjericão. Um fantástico prato onde a simplicidade impera e o produto se destaca. Chega à mesa um dos pratos da noite. Cherne ao sal, açorda de marisco com ovo de coderniz, gamba da costa do Algarve, mexilhão, percebes, salicórnia e molho de caldeirada. O mar a cada garfada num restaurante que não fica assim tão próximo da costa quanto isso. O ponto de cozedura do peixe que nos é levado à mesa envolto na cúpula de sal estava perfeita. A açorda que é envolvida por nós no prato e todos os elementos do mar remetem-nos às noites de verão e às jantaradas entre família e amigos que tanto gostamos.


Sai o peixe e entramos na carne. David apresenta agora um Quinta de São José Reserva 2015 do Douro. Um vinho pujante que casa na perfeição com a vitela. Vitela Barrosã, essa que é servida com um creme de rúcula selvagem a fazer lembrar um esparregado, curgete, alcachofra e um molho de beterraba e vinho tinto no qual apetece mergulhar e sorver até acabar. Mais uma vez matéria de excelência e sabores fortes que finalizam em beleza os pratos salgados da refeição.


Chegam os momentos doces em duas sobremesas distintas, mas qual delas a melhor. Primeiro o mel do Marão, uma sobremesa que como o nome indica o mel é o rei do prato. Com ele vem um creme de limão, torrada, chá earl grey e sorvete de rum. Uma combinação de sabores perfeitos para um dia de outono e que é de fácil agrado a todos. Segue-se o "café", onde um gelado de café, um queque de chocolate e um perfeito sorvete de framboesa unem as forças para nos adoçar a boca. Uma sobremesa mais doce mas também de fácil agrado mesmo para os menos gulosos. No copo David surpreendeu com um Graham's The Tawny em tamanho XXL, de tal modo que a sala, conforme via a garrafa, acabava por querer também provar tal néctar. Claro que o repasto não podia terminar sem o serviço de chá, café e as gulosas mignardises, onde se encontravam trufas, macarons, madalenas e bombons.


Já num momento exclusivo e mais privado, tivemos a oportunidade e o prazer de trocar algumas palavras com Tiago e David em plena garrafeira, onde ainda bebemos um delicioso Moscatel Roxo da José Maria da Fonseca, um flute de champagne francês e uma agradável Colheita tardia tinta da Quinta da Alorna.


Tiago Bonito pode não estar à frente de uma cozinha numa grande cidade mas garantidamente já deixou a sua marca na cidade de Amarante. Certo que o Largo do Paço já tem um historial de bons chefes e de estrela mas a visão de Tiago vai levar o restaurante ainda mais além. Aberto de terça a sábado, somente ao jantar, o Largo do Paço trabalha com menus de degustação, servidos sempre em mesa completa, ou à la carte. 


Os menus têm os seguintes preços por pessoa: 
- Menu "Caminhos" 105€, degustação de vinhos "Escolha de Sommelier" 65€; 
- Menu "Identidade" 145€, degustação de vinhos "Escolha de Sommelier" 110€. 

À carta o valor rondará os 70€ por pessoa, já com vinho a copo. 

Podem fazer as vossas reservas para o número 255 410 830.